Sinais de esperança
1. Sinais
de esperança na crise
Neste
fim de semana participei em dois acontecimentos que me deixam antever alguma
luz no meio do túnel da crise, quando os políticos e a comunicação social criam
um fait divers a partir de expressões,
infelizes para uns e reais para outros.
Tratou-se
da bênção dos finalistas, vulgarmente denominada bênção das pastas, dos
estudantes do ensino superior de Beja, e da peregrinação aniversária das
aparições de Fátima, que este ano superou todas as expetativas no que se refere
ao número de peregrinos.
No
pavilhão multiusos da feira de Beja realizou-se, uma vez mais, a bênção dos
finalistas, preparada pelo Pastoral do Ensino Superior da diocese, orientada
pelo Pe. António Cartageno. Esta celebração envolve muitas pessoas, quase todas
estudantes: cantores, instrumentistas, leitores, acólitos, etc. E também atrai
muita gente a Beja, vinda de todas as partes do país, de modo que a cidade fica
inundada de carros. Há sempre um ambiente de muita alegria, que a reverberação
do pavilhão aumenta e não favorece a atenção a discursos nem a concentração.
Por isso optei uma vez mais por não ler ou proferir a alocução preparada e
limitei-me a proferir alguns desafios e provocações, que a seguir transcrevo.
Parafraseando
o trecho do evangelho proclamado, onde se lê “nem todo o que me diz: ‘Senhor, Senhor’
entrará no Reino do Céu, mas sim aquele que faz a vontade de meu Pai que está
no Céu”, afirmei: nem todo aquele que estudou e sabe entrará
no mundo do trabalho, mas aquele que tem padrinhos e cunhas de peso. Isto é
tanto mais verdade neste momento de grande percentagem de desempregados,
sobretudo entre os jovens.
Constatando a verdade desta afirmação entre os hábitos da
nossa sociedade, desafiei os finalistas a unir forças para mudar o nosso país destes
maus hábitos, que fomentam atitudes de preguiça, de pelágio, de falta de
criatividade, de atraso cultural, social e conómico. Baseados no seu saber,
devem mostrar que valeu a pena o esforço feito, que, aliado à investigação e inovação
contribuirá para o desenvolvimento e o progresso do país, tirando-o da crise e
evitando a emigração em massa dos nossos jovens formados e dos nossos cérebros.
Neste sentido elogiei os professores, as famílias e a
sociedade que acreditam no poder do saber, desafiando-os a continuar a sua
missão. Por isso lhes agradeci em nome dos finalistas e para todos implorei a
bênção de Deus, que todos os anos pedem ao Bispo de Beja, porque sentem que a
vida humana não é um processo do acaso, mas precisa de se abrir ao
transcendente, a Deus.
2. Saber humano e
bênção de Deus
A confiança na inteligência humana não se opõe à necessidade
de abertura à sabedoria e bênção de Deus. Este sentir faz parte da alma do
nosso povo e do seu bom senso. Por isso, espontâneamente, na procissão de saída
do recinto onde foi celebrada a bênção, muitas dezenas de finalistas se
aproximaram do bispo e pediram uma bênção especial e pessoal, o que fiz,
assinalando-os com o sinal da cruz na fronte, felicitando-os e incitando-os a
lutar com confiança.
Esta mesma abertura ao poder de Deus e à intercessão de Nossa
Senhora constatei nas centenas de milhar de peregrinos de Fátima, que nos dias
12 e 13 aguentaram longas horas, de pé, no recinto do santuário, participando
nas celebrações principais da peregrinação. Muitos tinham caminhado longos
quilómetros, como peregrinos que vieram a pé, para virem revigorar as suas
energias aos pés de Nossa Senhora. Há razões que só o coração conhece, como
dizia Pascal, e os rostos dos peregrinos, muitos com lágrimas a correr, isso
mesmo testemunhavam. A espiritualidade faz parte da estrutura da pessoa humana.
Isto mesmo afirmou o cardeal Ravasi, presidente do Conselho Pontifício para a
Cultura
Estas atitudes dos portugueses, quer dos estudantes quer dos
peregrinos de Fátima, fazem-me acreditar que vamos superar a crise. O esforço
humano, os investimentos, a investigação, a solidariedade, a justiça são
imprescindíveis. Mas sem a abertura ao transcendente, a Deus, sem a fé e
confiança do crente, sem a ajuda do alto, dificilmente se manterá a força e
integridade das virtudes humanas. Que Nossa Senhora de Fátima mantenha viva a
fé dos portugueses.
† António Vitalino, Bispo de Beja